Muito bem, depois de meses sem escrever, cá estou, dividindo mais um lampejo de pensamentos. Faz pouco mais de um mês que cheguei de Luanda, Angola, onde fui trabalhar em uma empresa que pretende construir casas populares lá. Levei comigo muitas pré-concepções do que seria realmente morar num país de língua Portuguesa e ainda na África.
Pobreza, violência, doenças sexualmente transmissíveis, malária... É (quase) tudo o que se escuta da África, mas, tirando a malária (e acrescentando-se a dengue) não é muito do que temos no Brasil? E logo que cheguei uma coisa engraçada que percebi foi alguns compatriotas se considerando melhores que os Angolanos, como se fôssemos cidadãos de primeiro mundo.
Com o passar dos dias fui sentindo a imensa falta de estrutura no país. Na empresa era raro o dia em que o gerador de energia não funcionava ou o dia em que a água chegava sem interrupção. Ficávamos sem energia praticamente todos os dias, e estávamos em Luanda (Capital). No período em que estive trabalhando tive que comprar água, que vem num caminhão pipa, diversas vezes para o alojamento e para o escritório. A internet e a comunicação por telefone também são muito precárias, não existe ligação a cobrar e o serviço de telefonia é bem caro.
Angola produz muito poucos produtos manufaturados, a maioria dos produtos que encontramos nos mercados vem da Europa ou mesmo do Brasil, por isso (também) o custo de vida é muito alto.
Aí começa a lição... Não estou certo se conseguirei descrever todo o sentimento e aprendizado que tive até agora, mas logo de cara o que percebi foi o respeito dos Angolanos por nós, nos tratando com muita educação. Depois de alguns dias percebi que essa educação e respeito não são só com Brasileiros ou estrangeiros (que muitas vezes são os chefes deles e não os tratam com o mesmo respeito), mas também existe uma educação e respeito entre eles mesmos numa relação fraternal, se ajudando uns aos outros, cuidando uns dos outros.
Vendo nossos irmãos Africanos se tratando com todo aquele respeito até arriscaria dizer que é carinho que eles tem entre si, lembrando aquela pureza e inocência que temos na nossa infância. Percebi também um respeito admirável pelos mais velhos, que são chamados de "Cota". Quando um Cota fala todos escutam!
Andando pela cidade se percebe a falta de infra-estrutura (dizem que já foi muito pior durante as guerras). Os serviços básicos, como o de saúde, são muito caros e a população na maioria é muito pobre. Tudo parece muito difícil e injusto, é chocante num primeiro olhar, mas aos poucos se percebe a força com que eles enfrentam as dificuldades. Com alegria no olhar, estão trabalhando nas ruas e nos "business" diários. Muitos e muitos Angolanos trabalham assim, vendendo coisas, desde cartões de saldo para celulares até pequenos geradores e cadeiras de praia. Tudo o que se possa carregar eles vendem nas ruas. O mais estranho que vi foi um jogo completo de sala.
Um grande erro que acredito que cometemos é medir as coisas apenas dentro dos nossos conceitos, como se tudo o que fosse diferente do que entendemos como certo ou bom estivesse errado ou ruim. É lógico que não podemos desconsiderar também alguns padrões de saúde e dignidade humanas que são indispensáveis, mas digo com respeito ao que é necessário se TER para uma vida feliz. Vi que a maioria dos meus amigos Angolanos é muito feliz com o "pouco" que tem, e o pouco deles é menos que o nosso pouco...
Essa nossa ambição de querer mais, subir na vida, ter o carro do ano (no meu caso carro é dispensável), reconhecimento das pessoas etc., não faz parte constante da vida dos Angolanos que convivi. Faz a gente repensar nossos conceitos.
Para finalizar essa primeira parte, uma das lições que tive foi valorizar ainda mais (e sempre podemos mais) a simplicidade da vida, a capacidade de ser feliz com pouco. É repetitivo, porém verdadeiro: podemos ser felizes com pouco!